CRIANÇAS TÊM EXCESSO DE TRABALHO
Grande parte dos alunos portugueses do Primeiro Ciclo têm uma carga de trabalho superior a oito horas diárias, ou seja, mais do que muitos adultos, já que ao período de aulas somam-se os trabalhos de casa “repetitivos e inúteis”, defendem especialistas da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico do Porto.
“A vida das crianças a partir dos seis anos não pode funcionar só a partir da escola. A escola é muito importante, mas a educação informal e os momentos de lazer e o brincar são fundamentais”, argumenta, em declarações à Agência Lusa, a investigadora Maria José Araújo.
Vendo o tempo médio de trabalho de um adulto, entre 37,5 a 40 horas semanais, percebe-se que muitas crianças trabalham no seu ofício de alunas tanto como um trabalhador adulto. Contudo, enquanto o trabalho profissional dos adultos é seguido de descanso para a maioria das pessoas, o trabalho escolar é cada vez mais desenvolvido dentro e fora da sala de aula, nota a investigadora.
“A cultura escolar sobrepõe-se à cultura lúdica”, refere Maria José Araújo, que lamenta que o tempo livre das crianças seja invadido pela escola, não deixando que a criança possa descansar e escolher o que fazer. Trata-se sobretudo da forma como as atividades são estruturadas, já que mesmo as atividades de enriquecimento curricular são pensadas em termos de escolarização.
“O ensino formal é muito importante e devemos estimular as crianças para isso. Mas depois de cinco horas de atividade letiva, é preciso descansar e brincar. As outras atividades que as crianças realizem devem ter uma metodologia lúdica”, defende.
Atualmente, a escola e a família parecem ter esquecido que a brincar se “aprende muito”: “as crianças não brincam para aprender, aprendem porque brincam. Brincar é viver, para as crianças. É necessário respeitar a cultura lúdica e as culturas da infância”. Repetir em casa o que se fez na escola, prolongando o tempo de trabalho escolar, é um dos erros que se tem vulgarizado, defende.
“Os TPC [trabalhos para casa] são muitas vezes repetitivos e inúteis. Meninos de seis e sete anos andarem a repetir letras e fichas, com o argumento de que eles gostam e precisam, devia ser proibido, como acontece já nalguns países”, sustenta Maria José Araújo.
Contudo, a investigadora diz que é necessário distinguir entre estudar e fazer TPC: “Estudar é importantíssimo e deve ser ensinado e incentivado. Deve ser mostrado isso às crianças. Mas estudar tem de ter a adesão voluntária de quem o faz. Já os TPC repetitivos podem ajudar a mecanizar, mas afastam a criança do sentido e do valor do conhecimento”.
Para Maria José Araújo, os TPC, a existirem, devem ser feitos na escola, eventualmente no apoio ao estudo e nada mais, até porque “representam muito em termos de tempo que ocupam, mas muito pouco em termos de estímulos cognitivos”. “Na verdade, se os TPC, tal como os conhecemos, ajudassem as crianças a ter sucesso escolar já se teria notado”, indica, sugerindo que se deve antes ajudar as crianças a compreender o significado do conhecimento e das diferentes formas de aprendizagem. “Saber não é só repetir e há muitos educadores que apostam mais nesta versão”, defende.
0 comentários:
Enviar um comentário
Obrigado pela sua participação.